A DOIDA DO MURO: UMA NARRATIVA CARREADA A VULNERABILIDADES, NEGLIGÊNCIA E ABUSO DE INCAPAZ

Apresentação

Em visita ao ESF Capim Duro, conhecemos a demanda ‘A doida do muro’. Trata-se de Jucilene Rosa, 44 anos, domiciliada há 10 anos na Jurubeba, convive com Pedro, 61 anos, tiveram 8 filhos, este vasectomizado há 18 anos, todos foram adotados, com o casal, convive apenas Leandro, fruto da 1º gestação. Desde o nascimento, Leandro morava com a avó altivo aos cuidados e laboro diário, após uma desilusão amorosa, iniciou um quadro de depressão, além da esquizofrenia que já convive trás histórico de internamento pós surto e abandono de tratamento, que o fez retomar o convívio com os pais. Convivem em casa simples, rodeada por altos muros, composta por 4 cômodos, e um casebre em anexo, destituído de porta, com dejetos e muito lixo no entorno, este destinado para o descanso de Jucilene. Usuária com história de 8 internações secundários a depressão pós-parto e esquizofrenia. Em 08/2021, encontro em peridomicílio, agitada, prolixa, despida, recebendo-nos a pedradas, na ocasião foi contida e medicada. Um mês após, o serviço de enfermagem do CAPS acionado, devido a crescimento de barriga de origem desconhecida e incitação da mesma que – ali existia um bebê, para a surpresa de todos, BHCG ++++/4+, a USG mostrou uma IG de 25 semanas. A gestação decorreu sob vigilância, em 12/2021 nasce uma RN do sexo feminino ativa e vigorosa por parto domiciliar desassistido, pesando 3,500 kg, díade mãe/filho passaram bem, a menina foi registrada com pré-nome de Jasmin, titulação escolhida por sua genitora

Objetivos

Descrever a narrativa ‘A doida do muro’, analisando os fatores contributivos ao desenvolvimento dos fatos

Metodologia

O enfermeiro e a assistente social se deslocaram até o domicilio para conhecimento do caso, de acordo com a sobrinha, única parente próximo, o casal antes residia na cidade de Rio Real/BA. Desde a vinda, fazia somente o uso de Diazepam de 10 mg apenas, resultante de uma das receitas trazidas provindas da última internação. Diante da impossibilidade de diálogo, todos os contatos mantidos se faziam extra muros e que contato interpessoal, só existia com o esposo e filho, a GCM foi acionada para dar suporte ao administrar as injetáveis, pós medicações administradas, o caso foi direcionado para a rede de apoio, inicialmente a UBS, com a finalidade de assisti-los em saúde, ao CRAS buscando sanar as fragilidades, trabalhar as potencialidades e fortalecer os vínculos, ao CREAS buscando irromper com a violação de direitos já existentes. Diante da notícia da gestação, o caso foi direcionado ao Conselho tutelar, visto que, a família cogitava a possibilidade de encaminhar o bebê para a adoção, inclusive já existia famílias pleiteando a vaga, assim deixamos o Conselho Tutelar ciente da situação, buscando evitar que a adoção ocorresse de forma empírica, por fim, o familiar, optou por deixa-la a criança entre eles. Por conta da proximidade com o caso, o CAPS acompanhou de perto toda a gestação, acompanhando-a em consultas, nas realizações de exames de imagem. Após a expulsão do concepto, o binômio mãe/filho, forma conduzidos a Maternidade Municipal, de ambulância para os cuidados pós parto

Resultados

Após a administração das injetáveis, foram disponibilizados medicamentos via oral, buscando dar seguimento ao tratamento em domicilio, e diante da considerável aceitação da usuária ao medicamento, conseguimos estabilizar o quadro, num curto espaço de tempo, atualmente a mesma cursa de forma aceitável, afável e solicita aos afazeres e que lhe é incumbido, nas visitas rotineiras realizadas pelo CAPS, o diálogo já é prata da casa. Quanto a gestação, esta foi acompanhada de perto pela equipe da UBS em parceria com o CAPS, culminando numa gestação saudável, e num nascimento bem sucedido. Com isso, foi verificada a importância da realização do CAPS Itinerante que tem como objetivo ampliar o acesso ao serviço de saúde mental do Município, auxiliando no processo de promoção da saúde mental nas zonas rurais, além de garantir um matriciamento efetivo das Equipes de Atenção Básica com foco na melhoria da oferta e desconstrução dos estigmas e preconceitos presentes. O envolvimento dos demais equipamentos foram cruciais para o fortalecimento dos vínculos, minimização das vulnerabilidades existentes, tentativa de reparo nos direitos violados e conscientização da necessidade da adoção segundo os tramites legais. Além dos psicotrópicos de uso diário, Jucilene recebe a cada três meses uma dose de Acetato de Medroxiprogesterona 150 mg/ml. Leandro segue medicado a cada 30 dias, em uso de medicações injetáveis administradas pela equipe da UBS, segue afável, tranquilo e solicito.

Conclusões

Contudo, entende-se que o contexto no qual a família se encontrava inserido fora formidável para o desenrolar dos fatos. A saber que o ACS é a ‘ponte’ que liga a equipe da UBS a comunidade estreitando os laços, possibilitando o conhecimento das realidades vividas no território, nota-se que houve uma omissão ou naturalização do caso, visto que a família já convivia no povoado há aproximadamente 10 anos. A situação citada requeria a introdução de órgãos de saúde, saúde mental e assistência social ao meio, já que persistia com vulnerabilidades de ordens diversas, a falta de engajamento, postergou os surtos psicóticos, o possível estupro e consequentemente a gestação, além da ausência de cobertura psicoterápica com Leandro e de medicação. Recomenda-se que as equipes de atenção básica estejam mais engajadas com as situações que requerem maior atenção e/ou as que fogem da normalidade existentes no território que compete as áreas de abrangência de cada equipe, acionando as respectivas equipes que compõem a rede de assistência, favorecendo o cuidado integralizado, como sugere os princípios do Sistema único de saúde.